Um vereador da Câmara Municipal de Loulé dizia há vários meses, orgulhoso, perante uma plateia, que Loulé acarinha e tem uma política ciclável. Na verdade, argumentava, o concelho é atravessado pela Ecovia do Algarve, a breve treco (então, segundo ele) seria lançado , o caderno de encargos para uma ciclovia que una Almancil à Quinta do Lago e outra que ligue Vale do Lobo a Almancil, sendo que a Quinta do Lago e Vale do Lobo já estão ligados pela Ecovia, que por sua vez as conecta a Quarteira. Perguntei-lhe quem estava a executar o caderno de encargos e a resposta não foi clara (penso que nem na cabeça dele a ideia estará clara). Perguntei-lhe em seguida se já teve oportunidade de visitar o troço da Ecovia e a forma como é sinalizada a ligação de Vale do Lobo a Quarteira (inexistente). Pareceu confuso, pelo que abandonei o assunto.
Discorreu em seguida que Loulé tem uma longa tradição no ciclismo (é um facto, ainda nesta Volta a Portugal obteve uma classificação meritória), tem duas pistas de BMX para os jovens e vários clubes e associações que promovem e organizam a prática do BTT. Evidentemente, nada disto tem que ver com políticas cicláveis, objectei, pelo que puxou do ás de trunfo e informou-me que estava construída uma ciclovia na zona nova a Nascente de Loulé, perto do hipermercado Continente "sendo que outras certamente se seguirão". Uma via com 850 metros, que conheço perfeitamente, é um verdadeiro case study, na medida em que liga uma horta (portanto não tem saída) a um arruamento rodeado de lotes por urbanizar.
Perguntei-lhe porque não se pensava em promover o uso da bicicleta nas cidades e vilas do concelho e ele disse que não é fácil, os hábitos instituídos, a falta de verba, o combate à desrtificação no interior. O costume, portanto. Perguntei-lhe se sabia quanto custava fazer um plano ciclável para Loulé, por exemplo. Depois aproveitei o silêncio para lhe explicar que um plano ciclável não carece de ciclovias, nem de esventrar ruas para instalar ciclovias.
E de facto assim é. Para tal apenas temos de criar três tipos de vias:
a) vias de velocidade máxima inferior a 30 kms/h
b) vias de velocidade entre 30 e 50 kms/h
c) vias de velocidade superior de 50 kms/h
Tome-se, no primeiro caso, como exemplo, na cidade de Faro. Numa via como a Avenida da República (a que vai da estação do caminho-de-ferro até ao Jardim da Doca (Manuel Bívar), uma vez que a velocidade de circulação será facilmente limitada a 30 kms/h (dada a existência de passadeiras elevadas já edificadas), é perfeitamente possível fazer partilhar a mesma via por bicicletas e trânsito mais pesado (de resto é a solução actual). Se se quiser proporcionar uma separação (porque a largura da via comporta), faça-se um traço no pavimento, com corredor de circulação para as bicicletas.
Tal solução pode igualmente ser aplicada em vias estreitas de circulação única, onde a bicicleta deve ocupar uma posição segura, não podendo ser ultrapassada se a largura da faixa não o permitir com segurança (um metro de distânca do veículo motorizado à bicicleta). Ou seja, existe PARTILHA da via entre a bicicleta e o restante trânsito.
Nas vias de velocidade entre 30 e 50 kms hora (na cidade de Faro um bom exemplo seria a Avenida 5 de Outubro e na cidade de Loulé a Av. 25 de Abril, que liga o Largo Duarte Pacheco à rotunda junto à CML) deve ser criado o corredor para bicicletas, sendo que a bicicleta deve estar na estrada. Este corredor não carece de ser uma ciclovia, basta que esteja assinalado no piso. Importante é que se garantam as condições de segurança na circulação para o ciclista, limitando a diferença de velocidades praticadas na via, através de passagens para peões elevadas e frequentes. Neste caso falar-se-ia de SEPARAÇÃO de trânsito.
Na terceira opção, deve-se criar a ciclovia perfeitamente demarcada e separada da faixa de rodagem, pelo que se falará de SEGREGAÇÃO. Em Faro, o exemplo perfeito seria o da Av. Calouste Gulbenkian, ou a estrada da rotunda do Aeroporto para a Praia de Faro e em Loulé a Av. que liga a rotunda da BP à zona industrial, ou as novas Avenidas de circunvalação (que a despeito de serem novas, não possuem este equipamento no seu planeamento).
O Sr. Vereador agradeceu, pediu-me o contacto, que forneci com prazer. Imagino que toda a informação tenha feito ricochete na cabeça do Sr. Vereador, dado que pouco se tem visto de novidades nesta matéria, mesmo ao nível do programa eleitoral para a campanha autárquica. Possivelmente o contacto também se perdeu. E uma oportunidade.